AUTOR: RUBEM ALVES »

O corpo é um delicado instrumento musical. É preciso cuidar dele, para que ele produza música. Para isso, há uma infinidade de recursos médicos. E muitos são eficientes.

Mas o corpo, esse instrumento estranho, não se cura só por aquilo que se faz medicamente com ele. Ele precisa beber a sua própria música. Música é remédio. Se a música for feia, ele ficará triste poderá mesmo até parar de querer viver. Mas se a música for bela, ele sentirá alegria e quererá viver.

Em outros tempos, os médicos e as enfermeiras sabiam disso. Cuidavam dos remédios e das intervenções físicas – bons para o corpo – mas tratavam de acender a chama misteriosa da alegria. Mas essa chama não se acende com poções químicas. Ela se acende magicamente. Precisa da voz, da escuta, do olhar, do toque, do sorriso.

Médicos e enfermeiras: ao mesmo tempo técnicos e mágicos, a quem é dada a missão de consertar os instrumentos e despertar neles a vontade de viver…

 (Rubem Alves, O Médico, Campinas SP 2002, pág 9-10)